segunda-feira, 2 de março de 2009

CONTRAPONTO NA RELIGIÃO.


Em cima do texto publicado pela irmã Áurea, de autoria de Carlos Piquera, NA UMBANDA NÃO HÁ DOUTORES, conversamos muito sobre um tema que traz uma inquietação dentro das religiões afro-brasileiras, que é a questão do conhecimento formal, a preparação de nossos dirigentes e médiuns para entender e formar massa critica.


O que queremos dizer com isso é que temos notado que todo o acúmulo de aprendizado dentro da religião não é suficiente para formar os conceitos que estão fora das quatro paredes da religião e dentro delas também, nosso povo tem capacidade de assimilar, mas falta questionar o porquê disso ou daquilo.

A simplicidade é uma virtude, mas nestes tempos em que tudo tem que ser falado, discutido e questionado, voltamos para dentro de nossas casas e vemos nossos médiuns apenas praticando sua religião muitas vezes sem entender o sentido do que está acontecendo, já que poucos dentro das casas tiveram acesso a uma educação formal e minoria ainda são os formados em faculdades.


A Umbanda, assim como outros agrupamentos religiosos, é formada por pessoas das mais diferentes classes econômico-sociais e étnicas, que, justapostas, formam o que se denomina de meio religioso intercorrente.


Mas até quando devemos ser assim, fechados ao conhecimento e formadores de opinião, deixando que meia dúzia de pessoas utilize o nome da religião em causa própria e sem valorizar os outros dirigentes de valor que temos espalhados por este país? A educação formal de nosso povo esta em xeque e, cumprindo com um papel social, precisamos criar massa critica e pensante na religião. E que seja através dos Doutores, Professores dentre tantos outros, precisamos alias necessitamos de colocar os conhecimentos no centro das discussões religiosas.


Todos, independente dos títulos honoríficos ou profissionais que possam ter, deverão estar irmanados com aqueles que não puderam alcançar um estágio intelectual ou cultural mais elevado, no sentido de juntos poderem dar sua cota de sacrifício e suor em prol de nossa religião.


Este é o discurso que não cabe mais, temos que estar irmanados sim, mas sabendo do nosso papel naquele momento, questionando, envolvendo-se e aprofundando dentro da religião.

Não se trata de uma tentativa de dar um caráter acadêmico à Umbanda, longe disso. Nem mesmo de querer criar uma casta de dirigentes graduados, pois bem sabemos do real e grandioso valor daqueles verdadeiros umbandistas, de pé no chão e tão pouco letrados. Trata-se, na realidade, de buscar uma ampla compreensão da Umbanda enquanto movimento social – e não apenas religioso – como também de fazer com que o umbandista entenda o funcionamento, a história, os fundamentos, os direitos e os deveres relativos à sua religião.


Ser umbandista não é somente se vestir de branco uma vez por semana e acender velas de cores variadas – isso seria “estar umbandista” naquelas poucas horas que dura uma gira. Ser umbandista é vivenciar a filosofia da religião que escolheu.

Não é segredo que a Umbanda é vítima de comentários quase sempre preconceituosos (baseados no senso comum e em verdadeiros mitos que se perpetuam ao longo do tempo), sendo que um dos mais recorrentes é aquele que diz que “a Umbanda é uma religião de pessoas sem cultura”. Não temos que provar nada a ninguém, no entanto sabemos que essa não é a realidade, já que nossa religião é um verdadeiro aglomerado de culturas diferentes, com povos diversos contribuindo com seu conhecimento. Porém, é fundamental que o filho de Umbanda entenda todo esse processo e também o funcionamento dos rituais, já que está inserido neles.

Não necessitamos de cursos de graduação, diplomas ou de pessoas de renome para que conquistemos o respeito enquanto instituição religiosa. Necessitamos de autocompreensão, e isso acontece de dentro para fora, do microcosmo umbandista para o umbandista enquanto indivíduo e dele para o macrocosmo. Ninguém é dono da Umbanda nem detentor das teorias que supostamente regem os seus fundamentos. Não pretendemos, com essa reflexão, transferir a questão para patamares elevados, pois eles são subjetivos, assim como a sabedoria não é prioridade de universitários. Queremos sim – e é bom que isso fique claro antes que venham as pedras, quase sempre atiradas por aqueles que defendem o comodismo ao dizer que não é necessário compreender as coisas, ou que a compreensão só se dá dentro de um terreiro ou templo – estabelecer um debate profundo com as diversas vertentes da Umbanda, para que tenhamos uma real compreensão de nossa própria identidade, de nossos direitos e deveres, respeitando as diversidades, pois essa é uma das nossas maiores riquezas, contribuindo para o nosso crescimento enquanto representantes daquilo que defendemos e professamos. Não precisamos de doutores ou professores de Umbanda, precisamos de umbandistas conscientes de seu papel. Que esse seja um despretensioso manifesto contra o comodismo intelectual tão arraigado e defendido por alguns em nome de uma suposta pureza umbandista.

Jordam Godinho e Douglas Fersan
Fevereiro de 2009

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